Bastou pouco observar para ver que diluía-se num torpor febril aquela dama decorosa e benfazeja tão logo o olhar de um cavalheiro se lhe voltasse a atenção. Àquele não resistiu:
- Por que não dança?
Como estátuas gregas se olhavam eternizados. E, diante daquele desfiladeiro, sua feminilidade só pensava nas vertigens prazerosas de um salto ornamental. Terminaria naqueles braços.
- Quem me dera tal experiência. É certo, porém, que meu corpo inclinar-se-ia, tão logo se pusesse junto ao teu, à libertinagem mais desprovida de escrúpulos. Não inconvenhamos.
Aquelas palavras a entraram lentas nos ouvidos e todas suas glândulas ouviram displicentemente. Seu sangue agora transportava algo novo e suas células exultaram. Seus olhos eram tão úmidos e quentes. De longe o cavalheiro todo se aqueceu.
A mulher que estava com ele voltou. Com destreza a primeira dama afastou-se em compassos bailarinos como fazem as borboletas em seus ensaios aéreos. Afastou-se do néctar e em nenhum momento a resignação suplantou a excitação ainda latejante.
- Senta aqui nessa cadeira amor, hoje minhas pernas estão me matando.
Tirava de si aquele estorvo regido pelo único mote de sua percepção. Via agora aqueles cabelos pretos que, dali, eram as cortinas ainda cerradas de seu mais esperado espetáculo. Fechou então os olhos, e sua perspectiva, agora só expectativa, o deprimiu profundamente.
Disse à outra - sem olhá-la - que voltaria logo, levantou-se e, antes do segundo passo, suspirou alto como quem precisa ouvir os próprios ruídos orgânicos para sentir-se vivo novamente.
Foi até o banheiro. e em poucos minutos sentia-se ensandecido, mas sóbrio, confuso e sagaz ao mesmo tempo. Uma vez transferidos da carteira para suas mucosas alguns gramas bastaram. Já tinha terminado quando, pelo canto do olho, pensou ter visto alguém à espreita de sua atividade. Virou num sobressalto e viu-se no espelho. Olhou aqueles olhos - espantados com a própria capacidade - e duvidou que eles pudessem ser melhores.
Logo, o primeiro ato começou. Ao sair, antes que desce o segundo passo uma mão o segurou. O ímpeto com que vinha decerto deslocou seu interceptor, não o suficiente, contudo, para pô-lo à luz. Permaneceu observando a escuridão membrada que vinha lhe agarrar de modo firme e suplicante. Eram mãos finas, mas fortes, e a perícia daquelas unhas vermelhas, tão grandes e inofensivas, denunciava uma astúcia desejosa e conseqüente.
Mergulhou naquela penumbra de delícias obscuras, qual pulo vertical sobre a sensualidade. Um náufrago apocalíptico de amores abissais.
Porquanto a escuridão o tomara de todo nada mais pôde ver claramente. Era, então, sensações. E estas perduraram, insistiram, resfolegaram, acenderam e apagaram inúmeras vezes no esplendor daqueles minutos.
Pairou então absorto, perplexo, entreabertos os lábios pulsavam estimulados, os pulmões no limite, transpirando calado, viu se afastar a musa de todas as suas pretensões carnais.
Aquilo havia sido forte demais para ele. Superlativo em sua sensibilidade e golpeado ainda por intensos regozijos fluidos e secreções alucinantes, decidiu e aproximou-se do balcão. Tomaria um bloody mary. O fez em dois goles. Ali sentado já parecia tranqüilo, era mesmo um ator!, a sua consciência reivindicava seu posto - ele a interrompeu com aquele longo e rubro copo.
Afinal da experiência que vivera sua vaidade jamais permitiu que extraísse maior proveito. Na verdade o que ele queria mesmo era voltar àquele espelho e contemplar o proprietário daquela existência tão arrogante quanto voluptuosa. Cambaleando ele sorria onipotente e seu trejeito faceiro era mesmo daqueles boêmios malandros do samba quente das esquinas centrais.
¨... restaram da essência,
indiferença,
e dor!¨
O fim da canção que ali tocava lhe pisou os tacos soltos da alma...
- Por que não dança?
Como estátuas gregas se olhavam eternizados. E, diante daquele desfiladeiro, sua feminilidade só pensava nas vertigens prazerosas de um salto ornamental. Terminaria naqueles braços.
- Quem me dera tal experiência. É certo, porém, que meu corpo inclinar-se-ia, tão logo se pusesse junto ao teu, à libertinagem mais desprovida de escrúpulos. Não inconvenhamos.
Aquelas palavras a entraram lentas nos ouvidos e todas suas glândulas ouviram displicentemente. Seu sangue agora transportava algo novo e suas células exultaram. Seus olhos eram tão úmidos e quentes. De longe o cavalheiro todo se aqueceu.
A mulher que estava com ele voltou. Com destreza a primeira dama afastou-se em compassos bailarinos como fazem as borboletas em seus ensaios aéreos. Afastou-se do néctar e em nenhum momento a resignação suplantou a excitação ainda latejante.
- Senta aqui nessa cadeira amor, hoje minhas pernas estão me matando.
Tirava de si aquele estorvo regido pelo único mote de sua percepção. Via agora aqueles cabelos pretos que, dali, eram as cortinas ainda cerradas de seu mais esperado espetáculo. Fechou então os olhos, e sua perspectiva, agora só expectativa, o deprimiu profundamente.
Disse à outra - sem olhá-la - que voltaria logo, levantou-se e, antes do segundo passo, suspirou alto como quem precisa ouvir os próprios ruídos orgânicos para sentir-se vivo novamente.
Foi até o banheiro. e em poucos minutos sentia-se ensandecido, mas sóbrio, confuso e sagaz ao mesmo tempo. Uma vez transferidos da carteira para suas mucosas alguns gramas bastaram. Já tinha terminado quando, pelo canto do olho, pensou ter visto alguém à espreita de sua atividade. Virou num sobressalto e viu-se no espelho. Olhou aqueles olhos - espantados com a própria capacidade - e duvidou que eles pudessem ser melhores.
Logo, o primeiro ato começou. Ao sair, antes que desce o segundo passo uma mão o segurou. O ímpeto com que vinha decerto deslocou seu interceptor, não o suficiente, contudo, para pô-lo à luz. Permaneceu observando a escuridão membrada que vinha lhe agarrar de modo firme e suplicante. Eram mãos finas, mas fortes, e a perícia daquelas unhas vermelhas, tão grandes e inofensivas, denunciava uma astúcia desejosa e conseqüente.
Mergulhou naquela penumbra de delícias obscuras, qual pulo vertical sobre a sensualidade. Um náufrago apocalíptico de amores abissais.
Porquanto a escuridão o tomara de todo nada mais pôde ver claramente. Era, então, sensações. E estas perduraram, insistiram, resfolegaram, acenderam e apagaram inúmeras vezes no esplendor daqueles minutos.
Pairou então absorto, perplexo, entreabertos os lábios pulsavam estimulados, os pulmões no limite, transpirando calado, viu se afastar a musa de todas as suas pretensões carnais.
Aquilo havia sido forte demais para ele. Superlativo em sua sensibilidade e golpeado ainda por intensos regozijos fluidos e secreções alucinantes, decidiu e aproximou-se do balcão. Tomaria um bloody mary. O fez em dois goles. Ali sentado já parecia tranqüilo, era mesmo um ator!, a sua consciência reivindicava seu posto - ele a interrompeu com aquele longo e rubro copo.
Afinal da experiência que vivera sua vaidade jamais permitiu que extraísse maior proveito. Na verdade o que ele queria mesmo era voltar àquele espelho e contemplar o proprietário daquela existência tão arrogante quanto voluptuosa. Cambaleando ele sorria onipotente e seu trejeito faceiro era mesmo daqueles boêmios malandros do samba quente das esquinas centrais.
¨... restaram da essência,
indiferença,
e dor!¨
O fim da canção que ali tocava lhe pisou os tacos soltos da alma...